O jogo
Saio de casa de manhã para ir pra escola. Está muito, muito frio. E escuro, uma serração cobre toda a cidade, do meio quarteirão não dá pra saber quem passa na esquina. Vou pisando na grama que cresce entre as fendas do passeio só pra ouvir o gelo se quebrando, então geou de madrugada.
Saio da rua Coronel Lambert e subo a Quintino Bocaiuva carregando minha pasta com cadernos e livros. Então atravesso o Jardim e vejo no meio da névoa os homens saindo do Clube.
Fazem umas rodas de conversa final, se despedem e vão para casa.
Na hora do recreio, vem os comentários
- Fulano perdeu o jipe.
- Sicrano perdeu a casa.
- Beltrano perdeu o terreno, que herdou do pai, e mais não-sei-quantos mil cruzeiros.
De noite, na Igreja, as mulheres fazem novena para que o fulano, sicrano e o beltrano parem de jogar e, algumas, aproveitando, que alguns deles parem de beber também.
Os homens jogam de 10 da noite até 6 da manhã, fumando e tomando café. Perdem casa, terreno, bens, dinheiro e a saúde.
Mas sempre fica um mistério: se tantos perdem, quem é que ganha? Ou o dinheiro some na neblina, quando aparece o Sol?