O Montanhês

De Wiki Cambuí
Revisão de 08h38min de 3 de outubro de 2015 por 189.83.207.234 (discussão) (Criou página com 'José do Carmo Eiras (1917-2006), o ''Zé Montanha'', ganhou este apelido por ter sido gerente da "A Montanha", jornal semanal que circulou em Cambuí entre abril de 1948 a d...')

(dif) ← Edição anterior | Revisão atual (dif) | Versão posterior → (dif)
Ir para: navegação, pesquisa

José do Carmo Eiras (1917-2006), o Zé Montanha, ganhou este apelido por ter sido gerente da "A Montanha", jornal semanal que circulou em Cambuí entre abril de 1948 a dezembro de 1950. O jornal tinha como diretor-responsávei o deputado Milton Salles, da UDN, e, além de fazer o jornal como tipógrafo, Eiras publicou vários poemas satíricos assinados como "Montanhês". Os poemas tinham dupla função: satirizar os políticos adversários e preencher os espaços em branco conhecidos como “calhau” na gíria dos gráficos.

Se na oposição estava a A Montanha, jornal, na situação tinha A Gazeta, jornal, dirigida pelo advogado Haley Lopes Bello e tendo como tipógrafo Pedro Nogueira, que obviamente passou a ser conhecido como Pedro Gazeta. E é sobre um escorregão deste jornal, que o Montanhês satiriza peIa primeira vez em 5 de dezembro de 1948. Um certo réu teria sido “absorvido" pelo advogado Bello.

“Eis um ‘belo’ advogado Que põe alma na defesa E o homem - tento contado - Vai pra rua com certeza... Pois manejando o Direito Vejam só, meu Deus do céu – É Preciso ser perfeito Para ‘absorver’ o réu!..."

Numa nota no pé do poema, o Montanhês avisa que "absorvido" quer dizer "engoli¬do, consumido, recolhido em si".

No poema seguinte (A Montanha, nº 34, 121248), o "Montanhês" satiriza a ordem do prefeito do PSD, João Batista Lopes, para que o Posto de Saúde só funcionasse do meio-dia às 16 horas. Há no poema uma notável atualidade sobre a saúde pública.

"Muito bem, Senhor Prefeito! Tudo tem que ser bem feito Ordem em tudo, isto sim! Somente o que não tem hora E que entra noite afora É bilhar ou botequim Se é pobre, cambuiense O Posto é teu, te pertence Respeita, porém, o trato: Se tu ficares doente Assim, sem mais, de repente ‘Tem que ser’ das doze às quatro! Se tiveres congestão Ou mesmo intoxicação Dor de calo, ou outra dor Podes ficar sossegado Serás logo medicado No Posto pelo doutor Mas, por Deus, tenhas juízo! Lembras-te sempre do aviso Esquecê-lo é fatal! Se chegares adoecer É preciso, ‘tem que ser’ das doze às quatro! Que tal?!..."

Em 19 de dezembro de 1948, a sátira do Montanhês ataca o prefeito naquilo que é matéria-prima de todas as sátiras: a moralidade pública. Caminhões do prefeito estariam sendo pagos por serviços prestados à Prefeitura sem concorrência. No meio da sátira, os trocadilhos com a palavra "sal" se referem ao contrabando do produto feito durante a Segunda Guerra.

"A Gazeta" domingo vinha Distribuindo louvaminha Ao nosso "caro" prefeito: "No começo foi ferreiro... Em ser honesto, o primeiro: Homem limpo e é direito!... Depois num grande salseiro Quem ganhou muito dinheiro Com a guerra, aos montões? Salvando esse salvatério Do comentário, o critério Do caso dos caminhões! Co'esse recurso confuso, De guerra... caminho escuso... Câmbio negro... (Que embrulhõesl) "A Gazeta" deu resposta À história (sem proposta) Do caso dos caminhões!... Vale à salvante embrulhada (Lenga-lenga salmodiada) Que "inocenta" os chefões! Salvaguarda da aparência (Salário sem concorrência) Do caso dos caminhões!... Que o Prefeito foi ferreiro Teve... e tem dinheiro... De acordo, sem senões!... Mas — que diabo! — em que ficou ("A Montanha" publicou) O caso dos caminhões?..."

No número seguinte, de 26 de dezembro de 1948, o "Montanhês" volta a pegar um besterol publicado na "A Gazeta". O jor¬nal do PSD, através do seu colunista "Mu-tuca" (Não se sabe até hoje a identidade correta do "Mutuca", entretan¬to as suspeitas recaem sobre Antônio Anas¬tácio de Moraes, o "Tonho do Nico", fun¬cionário publico), deseja que o número de placas colocadas em Cambuí pelo prefeito João Lopes seja bem maior do que as colo¬cadas pelo ex-prefeito, também do PSD, José Nascimento.

"De São Paulo, o Mutuca Em carta, agora, cutuca O prefeito a emplacamento Placas e placas sem fim: ‘Placas em tudol Vá por mim Siga o José Nascimento’ Quanto a isso, não contesto E a favor me manifesto Do tal da placamania! Meteu placa em todo o lado Da cadeia ao mercado... Salve o ‘ex’ da placaria!... E aqueles que inda virão É certo, lembrar-se-ão Desse governo a...placável Que com placa...bilidade Governou nossa cidade Fazendo tudo notável Segui-lo deve o Prefeito Emplaque todo o seu feito Eis uma ideia aplicável E não quero implicar: Tente com a placa aplacar O murmúrio im...placável".

O último poema do "Montanhês" apare¬ceu no número 37 d"A Montanha", de 2 de janeiro de 1949. Um surpreendente defeito mecânico num gramofone revela o político.

"Possuía meu conhecido Alguns discos e um gramofone E ao sentir-se aborrecido Entediado ou mesmo insone Infalível ser ouvido Para as mágoas espantar Polcas e valsas chorosas Dessas próprias pra ninar... E o que mais me divertia (Ficando ele atrapalhado) Era um disco em qual se ouvia Um discurso tão gozado Dum político que existia Numa vila, o Sô Leutério Nele o tal se elogiava E num rompante esclamava - Eu sou um homem muito sério! É que tanto ele tocava O disco veio a estragar... A agulha não avançava E o pobre do Só Leutério Começando a discursar Exclamava sem cessar "Sério... sério... sério... Assim é o caso presente Da Gazeta com o Prefeito "Homem honesto e direito?" Ele somente! Ele só.. .mente"

Luís Carlos Silva Eiras